Descrição: Gravura a buril sobre papel retangular disposto na vertical. Dupla composição pictórica figurativa e centralizada, gravada a preto sobre fundo branco, representando as seguintes cenas:
. em cima - 3 figuras humanas (Família Real Portuguesa), sendo a central masculina (D. Pedro IV) e as restantes duas femininas (à esquerda D. Amélia Augusta de Beaurharnais e à direita D. Maria da Glória - futura D. Maria II) apresentando um documento em papel (Carta Constitucional de 1826) sobre uma bandeira (bandeira monárquica portuguesa) apoiada em palmas, ramos de oliveira e ramos de carvalho;
. em baixo - 11 figuras humanas, estando 3 delas ao centro, sobre um estrado (D. Pedro IV à esquerda, D. Maria II ao meio e a deusa Minerva à direita) e as demais organizadas em dois grupos laterais (à esquerda os apoiantes do Constitucionalismo - e à direita os oponentes), tendo ao fundo o mar com embarcações oitocentistas.
Na cena superior D. Amélia está representada em meio corpo, a três quartos para a direita, olhando na direção do espectador. Tem cabelo escuro, apartado ao meio e apanhado em 4 partes, duas lisas ao alto e duas onduladas nos lados. Tem o rosto ovalado estreito, sobrancelhas curvas, olhos amendoados largos, nariz estreito, lábios finos, pescoço alto e ombros largos. Usa brinco em lágrima, colar de pérolas com duas grandes voltas, faixa cruzada da direita para a esquerda e colar com insígnia estrelada cruzando do lado oposto, vestido com manga comprida de balão e decote largo (tapando apenas a extremidade dos ombros), pulseira de pérolas com fecho cordiforme. Na mão direita segura um lenço.
D. Pedro IV está representado em meio corpo, a três quartos para a direita, olhando na direção do espectador. Tem cabelo escuro, apartado à esquerda, com volume ondulado nos lados. Tem rosto ovalado largo, matacões e mosca, sobrancelhas tendencialmente retilíneas, olhos amendoados e de cantos ligeiramente descaídos, nariz largo e lábios carnudos mas pequenos. Enverga farda de generalíssimo, cruzada por faixa das Três Ordens e insígnia do Tosão de Ouro. Na mão direita segura um rolo onde se lê a inscrição «Carta Constitucional / Para o Reino de Portugal Algarves e seos dominios / Chap 01 - Chap 10 [... preenchido com simulação de texto ...]».
D. Maria II está representada em meio corpo, a três quartos para a esquerda, olhando em frente. Tem cabelo escuro, apartado ao meio e apanhado em 3 partes, 1 lisa ao alto, com entrançado em volta, e duas encanudadas nos lados. Tem o rosto ovalado, sobrancelhas muito finas e pouco arqueadas, olhos amendoados estreitos, nariz estreito e comprido, lábios finos e bem recortados, pescoço curto e ombros largos. Tem faixa das Três Ordens e insígnia do Tosão de Ouro, vestido com manga comprida de balão e decote largo (tapando apenas a extremidade dos ombros), pulseira larga com gema oval à esquerda e relógio de pulso à direita. Depõe a mão direita sobre a Carta Constitucional e com a mão oposta segura a extremidade deste documento.
Na cena inferior o centro é ocupado pelo Trono Régio, enquadrado por bandeiras que caem lateralmente. Tem costas circulares estofadas de veludo, cachaço com Coroa Régia guarnecida de coroa de louros, assento estofado a veludo, com almofada do mesmo tecido, apoio de mãos em bola e braços entalhados. Na parte superior do estrado encontra-se D. Maria II. Está representada de corpo inteiro, a três quartos para a esquerda, olhando em frente. Tem cabelo escuro, apartado ao meio e apanhado em 3 partes, 1 lisa ao alto, com entrançado em volta, no qual encaixa a Coroa, e duas encanudadas nos lados. Tem o rosto ovalado, sobrancelhas muito finas e pouco arqueadas, olhos amendoados estreitos, nariz estreito e comprido, lábios finos, pescoço curto e ombros largos. Tem faixa das Três Ordens, vestido com manga curta de balão e decote largo em V (tapando apenas a extremidade dos ombros), manto comprido de arminhos, pulseira larga com gema oval à esquerda e relógio de pulso à direita. Na mão esquerda segura o Ceptro Régio. O pulso direito é tomado por D. Pedro IV.
D. Pedro IV está representado de corpo inteiro, a três quartos para a esquerda, olhando em frente, descendo a parte superior do estrado. Tem cabelo escuro, apartado à esquerda, com volume ondulado nos lados. Tem rosto ovalado largo, matacões e mosca, sobrancelhas tendencialmente retilíneas, olhos amendoados e de cantos ligeiramente descaídos, nariz largo e lábios carnudos mas pequenos. Enverga farda de generalíssimo, cruzada por faixa das Três Ordens e insígnia do Tosão de Ouro. Na mão direita segura a Carta Constitucional que parece entregar a um general.
À esquerda encontra-se um grupo de quatro figuras alegóricas: um homem trajado de general (em alusão aos apoiantes da facção liberal de D. Pedro IV que protagonizaram a Guerra Civil contra D. Miguel), um homem coroado de penas, envergando manto, com pulseiras e tornozeleiras largas e segurando um ramo de oliveira na mão esquerda (representando um chefe índio brasileiro); uma mulher segurando uma cornucópia vertendo moedas e jóias (representando a Fortuna do Brasil) e um homem tonsurado com hábito religioso e mãos cruzadas sobre o peito (representando um padre jesuíta de missão evangélica no Brasil). Atrás deste grupo vê-se uma armada de navios e uma fateixa (em alusão ao desembarque do exército liberal, comandado por D. Pedro IV, nas praias entre o Mindelo e Pampelido, a 8 de Julho de 1832 - início da Guerra Civil) e um canhão com balas (aludindo à Guerra Civil entre liberais pedristas e absolutistas miguelistas).
À direita do grupo central vê-se a deusa romana Minerva na parte superior do estrado, com elmo, escudo, couraça e lança, combatendo os inimigos de D. Pedro IV. À sua frente encontra-se um homem caído do estrado, coroado, praticamente desnudo mas parcialmente coberto por manto, em atitude defensiva relativamente à deusa mas tentando apunhalar um outro homem (poderá tratar-se de uma alegoria à deposição do Absolutismo). O homem que foge do punhal enverga uma capa, retira uma máscara do rosto e precipita-se no mar (possível alegoria à Falsidade). Atrás da figura anterior estão outras 2 já no mar, desnudas, de cabelos revoltos e com expressão rebelde, a primeira das quais empunhando serpentes na mão direita (eventual alegoria ao Mal). No horizonte vê-se o convés de uma embarcação de partida.
Assinado no canto inferior direito: «N. Maurin».
Inscrição abaixo da cena inferior: «Lith. de M.elle Formentin, rue des S.ts Pères, N.º 10».
Inscrição mais abaixo: «S.M.I. O SENHOR D. PEDRO RESTITUINDO SUA AUGUSTA FILHA D [SIC - D.] MARIA SEGUNDA, E A CARTA CONSTITUCIONAL AOS PORTUGUEZES. 1832 / Eu desta gloria só fico contente | Que a Liberdade dei a minha gente.».
Inscrição no canto inferior esquerdo: «No Porto em Casa de J. B. Fontan [SIC - Fontana], na Calçada dos Clerigos, N.º 19.».
Inscrição no canto inferior direito: «A Paris, chez Bulla, rue S.t Jacques, N.º 38.».
Origem/Historial: Litografia executada em França, na Litografia de Mademoiselle Formentin, a partir de um original de Nicolas-Eustache Maurin, e reproduzida em gravura em França e em Portugal, respetivamente pelos editores Bulla (Rue de Saint Jacques, N.º 38, Paris) e J. B. Fontana (Calçada dos Clérigos, N.º 19, Porto).
A edição portuguesa foi anunciada na Chronica Constitucional do Porto, a 26 de Julho de 1833, e apreçada em 2.400 reis.
A importância da obra e a sua divulgação devem-se à explícita mensagem apologética do Constitucionalismo e da fação liberal que apoiava D. Pedro IV, por oposição à fação absolutista que apoiava D. Miguel, no ano de início da Guerra Civil (1832), a qual terminou dois anos mais tarde (1834).
Na Biblioteca Nacional de Portugal existem dois exemplares desta litografia com as Cotas E. 190 A e E. 277 A. No entanto, ao nível das legendas, ambos apresentam diferenças entre si e entre o da AR:
- no exemplar com a Cota E. 190 A em vez de «Eu desta gloria só fico contente» lê-se «En derta gloria só fico contente»;
- no exemplar com a Cota 277 A não há gralhas;
- no exemplar da AR N.º Inv. MAR 4817 em vez de «Casa de J.B. Fontana» lê-se «em Casa de J.B. Fontan».
Depreende-se, pois, que nenhum dos 3 exemplares pertence à mesma tiragem.
Este objeto está relacionado com os seguintes objetos (2.0):
Nº de inventário: E.190 A.; Denominação: Alegoria à outorga da Carta Constitucional de 1826; Localização: Biblioteca Nacional de Portugal
Nº de inventário: E.277 A.; Denominação: Alegoria à outorga da Carta Constitucional de 1826; Localização: Biblioteca Nacional de Portugal
Incorporação: Aquisição a D. Segismundo de Bragança.
Bibliografia
SOARES, Ernesto; Henrique de Campos Ferreira Lima - Dicionário de Iconografia Portuguesa (Retratos de Portugueses e de Estrangeiros em Relações com Portugal). Lisboa: Instituto de Alta Cultura, 1960
Exposições
"Res Publica - Cidadania e Representação em Portugal - 1820-1926"